Salto qualitativo impulsiona cacau na Bahia

A paisagem do Sul da Bahia voltou a irradiar as cores da confiança e da pujança com os novos rumos dados ao seu setor cacaueiro. Milhares de propriedades ativas de pequenos e médios produtores, novas técnicas de cultivo e manejo, feiras atraindo expositores e visitantes de diferentes estados do país e do exterior, agroindústrias e novos centros de pesquisa são alguns dos elementos que compõem essa nova paisagem regional e que sinalizam que muito está por vir.

Arnaldo Francisco Cardoso

Uma das conquistas do setor, resultante de ação organizada com visão estratégica empreendida por diferentes agentes foi o reconhecimento em 2018 pelo INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) da Indicação Geográfica (IG) do Sul da Bahia na modalidade Indicação de Procedência (IP) para as amêndoas de cacau. De acordo com o INPI a Indicação Geográfica (IG) “é um ativo de propriedade industrial usado para identificar a origem de um determinado produto ou serviço, quando o local tenha se tornado conhecido, ou quando certa característica ou qualidade desse produto ou serviço se deva à sua origem geográfica.”

A região abrangida por essa IG do Sul da Bahia se estende por 61.460 km², que abrange mais de oitenta municípios. Essa conquista, fruto de quase dez anos de trabalho, deu novo impulso para projetos na região.

O que de mais importante e promissor deve ser observado nesse renascimento do setor cacaueiro no Sul da Bahia é que ele vem se realizando envolvendo os diversos atores da cadeia produtiva. O governo do Estado da Bahia e de alguns municípios, por meio de suas agências e instituições oficiais como o SEBRAE e a CEPLAC, tiveram papel destacado nesse processo, mas o que fez a diferença foram as iniciativas e engajamento de pequenos e médios produtores de cacau, empresários da indústria e de serviços e uma gama de outros profissionais, destacadamente pesquisadores com estudos voltados ao mapeamento e compreensão dos desafios presentes em cada elo da cadeia produtiva, orientados por uma visão de sustentabilidade.

Essa nova organização do setor apresenta semelhanças com processos que vem ocorrendo em determinadas regiões de países europeus como Itália e Inglaterra e que tem merecido importantes estudos acadêmicos e apoio para seu desenvolvimento. Essa nova forma de organização é sustentada por interações entre variados agentes locais como produtores, fornecedores, clientes, distribuidores, bem como a própria comunidade, criando mecanismos de cooperação onde é fluente a troca de conhecimentos e tecnologias que criam valor compartilhado. Nesse ecossistema, as universidades e centros de pesquisa cumprem papel fundamental criando parcerias para a qualificação de mão-de-obra, desenvolvimento e gestão de processos e certificação de produtos.

No Sul da Bahia, a Universidade Estadual de Santa Cruz que mantém linhas de pesquisa sobre a cadeia do cacau, sedia desde 2017 em seu Parque Científico e Tecnológico, CIC (Centro de Inovação do Cacau), que realiza análises de amêndoas de cacau e chocolate, e assim, propicia um monitoramento da qualidade do cacau brasileiro, valorizando o produto nos mercados nacional e internacional. A diferenciação do produto vem permitindo a um número crescente de produtores escapar da dependência do mercado de commodities e investir na segmentação, do qual o bean-to-bar é um dos melhores exemplos.

O CIC é dirigido pelo biólogo Cristiano Villela Dias, doutor em Genética e Biologia Molecular e conta em sua equipe com os experientes biólogos e pesquisadores Adriana Reis e Samuel Saito também doutores em suas áreas de especialização. Um ambiente que estimula o desenvolvimento de mecanismos de cooperação, transferência de conhecimentos, complementaridade e exploração de sinergias, promove ganhos para todos agentes da cadeia e, ainda mais importante, promove o desenvolvimento econômico e social, sustentável, de toda uma região. É isso o que está em curso no setor cacaueiro do Sul da Bahia e vem atraindo atenção e investimentos, podendo fazer dele modelo para o desenvolvimento de outros tantos setores produtivos no Brasil.

Arnaldo Francisco Cardoso é pesquisador e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Alphaville.

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